A noite era quente como de verão, mas ainda era primavera. O céu e a chuva que caiam, porém, eram frios e nada acolhedores, parecidos com os de inverno.
Mas pela quantidade de folhas mortas no chão eu poderia jurar que era outono.
Dada a confusão de características, esta era a minha noite.
Olhando para o lado de fora, vi toda a agitação da festa que acontecia há poucos minutos e foi estragada pela chuva. Ainda assim, a rua estava cheia e as pessoas pareciam não ligar para as gotas geladas que caiam sob seus corpos extremamente quentes.
Talvez por isso mesmo eu tenha entrado em casa. Meu corpo não estava quente e a água fria me incomodava bastante.
Nesta noite, o vazio do calor tinha um agravante.
Contraditoriamente, quando se te uma fonte de calor humano só para si, o frio aumenta.
O ar estava carregado, mas não era de umidade e nem era qualquer ar. Era o meu ar. E ele estava carregado de um profundo desejo intensificado pela saudade.
Já me disseram que isso tem um nome, mas não me recordo agora.
Acho que meu estado é preocupante, afinal, sentir-me feliz sem qualquer motivo aparente, ter um brilho nos olhos ao sorrir e suspirar de saudade não são coisas normais para mim.
Tenho medo daquela palavra que me esqueci qual é.
Medo do que ela representa e de tudo o que traz consigo.
Sofre-se muito por causa dela.
Noites que deveriam ser de verão se tornam noites de inverno e folhas mortas de outono se assemelham a cacos de um coração partido. Mas ao mesmo tempo, minha mente vaga por um campo completamente colorido pelas flores das mais diversas espécies.
Pieguices à parte, as coisas parecem levitar seguramente sob meus pés, apesar do meu esforço para mantê-los agarrados ao chão.
Há uma mão estendida para mim com olhos que dizem muito mais do que os textos românticos de Vinícius e Pessoa já me disseram. Exagero ? Não, não. Só quem já pôde enxergar tal olhar sabe o que é isto.
Seguro tal mão ? E se eu cair ? Não, não cairei, pelo menos não agora. Se eu for pensar no que pode acontecer ao invés de viver as possibilidades, como poderei saber ?
Eu vou. Deixar-me-ei levar pela plenitude da primavera, vivendo seus momentos de verão, não me abatendo com o frio temporário que pode me assolar e não pensando em quando as folhas mortas de outono irão chegar nestas quatro estações em uma que é o (lembrei a palavra) amor.